02 novembro 2009

This is It


Michael Jackson foi uma figura tão importante quanto estranha, e creio não ser necessário enumerar as passagens de sua vida, sejam elas pessoais ou profissionais, que justificam essas alcunhas. Porém, sua morte precoce, em 25 de junho deste ano, pouco tempo antes de sua última turnê, foi profundamente lamentada por pessoas de todo o mundo, evidenciando que, apesar dos escândalos nos quais ele se envolveu principalmente nas duas últimas décadas, Michael era, acima de tudo, o Rei do Pop, um artista completo, admirado e cujo talento era tão grande que, no fim, conseguiu superar as suas falhas de caráter – ou simplesmente fraquezas psicológicas.

This is It, documentário contendo imagens de ensaios para os shows da turnê homônima, chega aos cinemas apenas quatro meses após o falecimento do cantor. O longa é burocrático e traz na íntegra somente as músicas que seriam apresentadas nos shows, com imagens de diferentes ensaios da mesma canção se alternando, alguns poucos depoimentos de pessoas que trabalharam com ele durante esse período e outros momentos nos quais o cantor conversa sobre aspectos diversos das apresentações e das músicas.

O filme, no entanto, apesar de alcançar seu objetivo, é falho justamente por querer apenas dar sobrevida a Michael, como se fosse somente um consolo para os seus admiradores. Essa finalidade é muito pobre, e chega um momento em que, embora admire o que vê, o espectador fica cansado; afinal, ensaios não são shows, não têm a mesma energia e não são tão contagiantes. É natural, então, que a estrutura adotada pelo documentário exerça esse efeito, embora eu não acredite que isso ocorra com os fãs mais entusiastas.

Sobre o próprio Michael Jackson, This is It deixa a impressão de uma pessoa dedicada, perfeccionista, inteligente, profissional e gentil. O excesso de qualidades pode até ser visto como um defeito, mas isso não é algo que podemos julgar, já que ninguém sabe o tipo de pessoa que ele era na intimidade, apesar de eu não acreditar, por exemplo, que em todos os meses de ensaios não tenha acontecido ao menos uma discussão mais acalorada sobre algo, mesmo que houvesse claramente um respeito mútuo muito grande entre o cantor e toda a equipe, e também grande admiração por parte desta. Nesse sentido, nem posso dizer que o filme falhou, já que não fazia parte de seus planos mostrar coisas do tipo, mas, reitero, o problema aqui reside justamente nisso.

O documentário também conta com momentos bonitos, e um em particular merece ser mencionado. Aparentemente, envelhecer não era um dos objetivos de MJ. Ele sempre gostou muito de crianças – e nem vou entrar na questão de sua suposta pedofilia – e provavelmente preferia pensar que nunca deixou de ser uma delas. É bonito ver isso representado em uma passagem na qual ele sobe em uma estrutura de ferro que durante os shows o elevaria sobre a plateia. Seu entusiasmo é digno de um garoto em um parque de diversões, e é até engraçado ouvir o diretor pedir que ele se segure. A propósito, eu fiquei surpresa com a vitalidade do cantor. O vigor demonstrado contrapõe espantosamente a imagem fragilizada que ele passava ao aparecer em público andando de cadeira de rodas e usando máscaras e outras estranhezas que contribuíam para alimentar seu estigma de pessoa esquisita.

No fim, fica a sensação de que, com fins de registro, This is It é muito bom, mas como documentário é bastante superficial e comodista. De qualquer forma, os fãs sem dúvida ficarão extasiados, e é impossível deixar a sala sem admirar ainda mais o grande artista que Michael Jackson era e sem lamentar que aquele maravilhoso espetáculo jamais tenha ido além dos ensaios.

This is It
This is It, Kenny Ortega, 2009.

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